A educação está entre os setores mais impactados pela pandemia do coronavírus. A adaptação ao ensino remoto em um período tão curto abriu lacunas que exigem uma reinvenção de educadores e gestores. É comum ouvir falar de um novo normal; na educação, muitas das mudanças que começam hoje vêm para ficar.
Confira as principais tendências para o setor no próximo período e como as escolas devem se adaptar.
1. Novas formas de diálogo
Para Evelise Portilho, pós-doutora em Educação e professora do curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), as transformações no ambiente escolar foram importantíssimas até aqui.
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O simples fato de a escola não representar mais um mero espaço físico de troca e convivência demonstra que o caráter da educação nesse período foi profundamente transformado. Agora, entende-se mais do que nunca que ela vai muito além da sala, da lousa e do giz.
Em razão disso, a própria forma de ensinar precisa ser repensada. Segundo Portilho, é comum que os estudantes deixem as câmeras desligadas nas aulas online, seja por timidez, seja por problema de conexão, seja pelo incômodo diante da forma de “estar em sala”.
Diante desse novo comportamento, os professores precisam encontrar maneiras de criar mediações com os alunos, desafio que, para a especialista, é cognitivo, mas também afetivo e social. Além de definir instrumentos de transmissão de informação, é importante buscar meios para que o aluno elabore o conteúdo e o docente consiga ter feedback sobre a compreensão da matéria.
2. Informação versus conhecimento
A dinâmica “fora de sala” coloca a forma padrão de construir conhecimento em xeque, sobretudo diante de uma geração que tem material abundante por meio da internet. A questão não é como repassar informação, mas como construir conhecimento.
É nesse aspecto que a escola pode oferecer uma contribuição única e continuar a ter centralidade ao fomentar aprendizagens significativas. Se a instituição de ensino for mais uma fonte de informação, sua hegemonia é posta à prova, mas se, em vez disso, for um espaço para que o estudante formule o conhecimento que tem disponível, tende a ganhar força.
3. O papel da nota
Para Portilho, é necessária uma revisão profunda do papel da escola, que passa por uma crise burocrática, e dos especialistas na educação: deve-se tirar o foco das avaliações externas e artificiais e verificar outras formas de aquisição de saber do aluno. Isso fica claro quanto às notas.
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Para a educadora, elas não são capazes de refletir o aprendizado da criança, que pode ter ótimas avaliações, agradando a pais, professores e gestores públicos, mas nem por isso ter propriedade sobre o conhecimento.
Qual é o significado dessa nota? Não define mais ou melhor aprendizagem ou efetivamente uma aquisição. O aprendizado é um processo, e novas formas de avaliação precisam dar conta dessa complexidade.
4. Fora do quadrado
Agora que as aulas saíram da sala de aula pelo imperativo da pandemia, elas devem sair também do padrão, estando abertas a novos métodos. Portilho entende que se deve fazer um balanço sério sobre o que foi feito nesse período atípico, verificar resultados e repensar os aspectos metodológicos que ficarão daqui para frente.
As aulas devem romper com o aspecto fechado e tecnicizado para dar lugar a experiências mais dialógicas. Isso é relevante sobretudo porque, se é correto que o conteúdo formal pode ter ficado prejudicado, é verdade também que as crianças somaram uma série de experiências ao longo do período de ensino remoto. Deve-se aproveitar esse momento de mudanças para imprimir novos contornos ao processo de ensino-aprendizagem.
5. Escola como agente de transformação social
Para Portilho, os principais desafios da educação são de ordem estrutural. A pandemia da covid-19 escancarou as desigualdades do País, que perpassam a condição socioeconômica dos alunos e as dimensões cultural e educacional.
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A escola é um pilar fundamental da sociedade e deve aproveitar para se unir a outros setores e pensar em estratégias para a mudança social. “Precisamos ser mais ousados em relação aos planejamentos, às diferenças que existem entre os alunos e aos contextos educativos”, defende ela.
E não é só a escola que precisa ser transformada mas também o país. É urgente que as instituições de ensino contribuam para reduzir as desigualdades brasileiras, somando-se às comunidade ao seu redor.
6. Diálogo entre profissionais
Diante de tantos desafios, é hora de os profissionais dialogarem com franqueza sobre qual é o seu papel na escola e que sentido dar ao trabalho do grupo. A partir das mudanças bruscas que a pandemia provocou, pode-se discutir elementos básicos, como o que significa aprender nesse novo contexto e que outros fenômenos passam a mediar o processo de ensino-aprendizagem.
Os rumos que a escola vai tomar daqui para frente dependem da capacidade de criação e síntese dos profissionais para ressignificarem as práticas cotidianas com ousadia.